segunda-feira, 25 de abril de 2011

Teorias Organizacionais: Yes, we can!


Como aluno, docente e pesquisador da área de finanças estou acostumado a ser taxado de “capitalista” ou mesmo de “culpado pelas mazelas do mundo” e em “conluio com o grandes conglomerados financeiros”. O taxador se coloca, naturalmente acima desta posição e julga-se imune das mesmas influências que sofro em meu processo científico. É mais do que “chavão” o infantil debate entre as subáreas de pesquisa da administração: RH afirma que os seres humanos são os ativos mais importantes; o marketing afirma que a satisfação do cliente está em primeiro lugar; as finanças afirmam que o conceito central é o retorno do acionista... Tenho asco desse debate infértil, porque só colabora para o que Burrel (1999) apontou: a fragmentação de nossa disciplina nas escolas do pensamento e a correspondente fragilidade de uma elite universalmente aceita que está no controle.
Mardsen e Towley (1999) são completamente capazes de encerrar esse debate quando afirmam que os teóricos da administração compartilham um interesse comum em diagnosticar as causas da ineficiência dentro das organizações e na prescrição de como elas podem se tornar mais eficientes pela averiguação das condições subjacentes mediante as quais a realização das metas é promovida ou dificultada. Sobre o quase bulling acadêmico que sofri, encerro o debate: o paradigma norteador da nossa ciência administrativa é o gerencialismo. Ninguém que me taxou estava imune dele. Tudo está sendo cientificamente pesquisado, testado e escrito visando uma melhor eficiência organizacional.
Isso faz com que diversas ideologias dominantes se intercalem ao longo do tempo, normalmente elaboradas para consumo geral. Propagam-se os “MBA de Bolso”, os “Implemente Estratégia Competitiva na sua empresa”,  os “Finance for Dummies”, os “Globalize sua empresa em 10 minutos” e demais teorias deste tipo. Por isso, quando dou uma aula e finanças “prática”, sou normalmente elogiado. Conforme apontado por Mardsen e Towley (1999) a teoria é vista de forma pejorativa como inexequível, irreal ou “acadêmica”. A prática é interpretada como antítese da teoria e isso colabora ainda mais para que as práticas dominantes sejam simplesmente reproduzidas. Todos querem uma aula “prática”.
Comigo isso não foi diferente. Durante o curso do mestrado, quando estudávamos o Balanced Scorecard, fiquei interessado por alternativas ao modelo topdown de desenvolvimento da estratégia norte-americano. Onde é que eu fui atrás? Procurei imediatamente estudar o Tableau de Borde francês e tentar aplicá-lo à realidade de uma instituição cooperativista (logo, mais participativa) brasileira. Caí exatamente no vício de teste e aplicação de um conhecimento produzido no exterior sem me preocupar com a identificação com o movimento social adjacente. Provavelmente uma abordagem mais “teórica” deste tema teria sido vista com olhos desconfiados, porque o imperativo da produção em massa de conhecimento “prático” é o lema.
Porém, preciso deixar claro duas coisas: não estou afirmando que é necessária uma volta para ortodoxia; tão pouco ovaciono o relativismo científico que as teorias “práticas” resultam. Acredito verdadeiramente haver espaço para o desenvolvimento de um conhecimento mais genuíno e criativo, menos influenciado pela colonialidade cultural. Para isso, é necessário abandonar gradativamente o viés gerencialista de busca da eficiência da pesquisa para buscar um maior poder explicativo das teorias organizacionais. As dificuldades estarão na quebra do processo de construção do mito descrito no trabalho de Misoczky (2006).
“Yes, we can!” está no título como uma ironia a esta valorização excessiva da produção científica nos países de “primeiro mundo”. Podemos produzir teorias com identidade diferenciada, baseadas em nosso contexto social próprio. Não que uma teoria possa ser melhor do que outra simplesmente por ser mais “nacional”. Se isso fosse verdade, teria escrito “Yes, we can!” em Tupi-Guanari.

Referências Bibliográficas:
BURELL, Gibson. Ciência normal, paradigmas, metáforas, discursos e genealogia da análise. In: CLEGG, Stewart R.; HARDY, Cynthia; NORD, Walter R. (Orgs.) Handbook de estudos organizacionais. São Paulo: Atlas, 1999. Vol. 1, p.439-462

MARDSEN, Richard; TOWNLEY, Barbara. A coruja de Minerva: reflexões sobre a
teoria na prática. In: CLEGG, Stewart R.; HARDY, Cynthia; NORD, Walter R. (Orgs.) Handbook de estudos organizacionais. São Paulo: Atlas, 2001. Vol. 2, p.31-56

MISOCZKY, Maria Ceci. Sobre o centro, a crítica e a busca da liberdade na práxis acadêmica. Cadernos EBAPE.BR, v.4, n.3, outubro 2006. Disponível em: http://www.ebape.fgv.br/cadernosebape/asp/dsp_lst_artigos_edicao.asp?coded=42


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